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Economia - Pandemia: que mudancas no mercado de trabalho vieram para ficar?
RFI
Entrevistas com economistas, analistas de mercado, investidores e políticos, para explicar e comentar questões econômicas internacionais. O papel do Brasil e dos países emergentes na economia mundial.
Location:
Brazil
Networks:
RFI
Description:
Entrevistas com economistas, analistas de mercado, investidores e políticos, para explicar e comentar questões econômicas internacionais. O papel do Brasil e dos países emergentes na economia mundial.
Language:
Portuguese
Episodes
Caso Milei ilustra fascínio de libertários por criptomoedas, mas confiança de investidores no ativo também cresce
2/26/2025
A criação de uma memecoin pelo presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, e o escândalo da ascensão e queda meteórica da criptomoeda Libra na Argentina, sob o estímulo do presidente Javier Milei, ilustram o fascínio de seus apoiadores libertários pelos criptoativos. Mas o crescimento desses ativos também atrai cada vez mais investidores tradicionais, enquanto algumas das criptos mais famosas se consolidaram e um número crescente de transações pode ser realizada apenas por blockchain, sem passar pelo sistema bancário tradicional.
Bitcoin, Ethereum ou stablecoins: essas palavras entraram no vocabulário econômico nos últimos anos e ganharam um impulso inédito com a volta ao poder de Donald Trump. O republicano planeja transformar o país na “capital mundial” das criptos e deu a largada à flexibilização da regulação em vigor. Deseja, ainda, instaurar uma “reserva nacional de ativos digitais”, que poderia contar com fundos das reservas de ouro americanas.
Resultado: pela primeira vez, o Bitcoin ultrapassou a cotação de US$ 109 mil, em janeiro. “Se olhamos a valorização dos criptoativos nos últimos anos, a começar pelo Bitcoin, que iniciou em 2009, e outros que se seguiram, vemos uma curva exponencial. Mas se olharmos com mais cuidado, precisamos considerar a volatilidade muito alta”, pondera o economista francês Quentin Demé, professor de finanças da Sorbonne e autor de “100 mots pour comprendre les cryptomonnaies” ("100 Palavras para Compreender as Criptomoedas", em tradução livre).
“Em 2024, o Bitcoin começou o ano a US$ 50 mil, baixou a US$ 30 mil nos meses seguintes, ou seja, a 40% do seu valor. Na sequência, graças a algumas declarações de Trump, disparou a mais de US$ 100 mil”, resume o especialista, à RFI.
Demé relembra que as criptomoedas emergiram sob o impulso de geeks para escapar do controle do sistema tradicional e reencontrar uma forma de liberdade total para as transações financeiras, sem custos, impostos ou sequer registros. Para esses usuários, as moedas são utilizadas pelos Estados para controlar as populações.
Entretanto, na medida em que o sistema amadureceu, se tornou um investimento seguro para uma gama variada de interessados, mediante alguns cuidados. “Temos ainda essa ala das pessoas que se dizem libertárias e que, com as criptomoedas, querem se liberar dos bancos centrais, do FMI, etc. Não esqueçamos que elas fazem parte da população mundial”, afirma. “No entanto, uma grande maioria dos usuários fez essa opção como outra qualquer de investimento, para multiplicar as suas economias de uma maneira diferente das que existiam até agora.”
Sétimo ativo mais valioso do mundo
O economista observa que, apesar dos riscos da sua alta volatilidade, os investimentos em criptoativos já superaram o equivalente ao PIB de países como a França ou o Reino Unido. As criptos são hoje o sétimo ativo mais valioso do mundo – atrás do ouro ou da capitalização da Apple e da Microsoft, mas à frente da Meta.
Na França, um a cada oito investidores dispunha de criptoativos em 2024, uma alta de 28% em relação ao ano anterior, conforme levantamento da Associação pelo Desenvolvimento dos Ativos Digitais, com o instituto Ipsos e a consultoria KPMG. Dimitri Yem, diretor-geral do Yem Patrimoine, na região parisiense, se especializou em aconselhar clientes afortunados no universo das criptos, em busca de diversificação patrimonial. Ele nota que, à medida em que as criptomoedas passaram a ser aceitas até no comércio, a confiança também cresceu.
“Qualquer pessoa que possui criptos hoje pode viver quase totalmente à margem do mundo bancário tradicional. Ainda precisamos dos bancos, mas eu diria que 75% das nossas necessidades são cobertas sem os bancos, a menos que precisemos de empréstimo para um projeto imobiliário, por exemplo – embora até empréstimos possam ser feitos por criptos, e é bem simples”, explica.
Países 'cripto-firendly'
Desde novembro, a famosa loja de departamentos Printemps, em Paris, aceita pagamentos diretamente...
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Sombra do declínio econômico alemão paira sobre vizinhos europeus
2/19/2025
A locomotiva europeia está em pane. Louvada há mais de meio século por suas indústrias, suas exportações e seu mercado de trabalho, a Alemanha amarga há dois anos uma recessão cuja luz no fim do túnel ainda não apareceu. A situação econômica delicada é um dos principais temas da campanha eleitoral no país, para as eleições legislativas de domingo (23).
A pandemia de coronavírus e as consequências da guerra na Ucrânia atingiram em cheio a Alemanha, altamente dependente da performance industrial e das exportações. A disparada dos preços da energia e a concorrência chinesa colocaram o modelo econômico alemão em xeque e o país entrou no caminho da desindustrialização, com recuo de 3% da produção e 10 mil empregos industriais perdidos por mês.
"Podemos dizer que a Alemanha ficou para trás em relação aos grandes países da zona do euro. Basta olhar para a evolução do crescimento alemão depois da crise do Covid. O nível de produção está muito pouco superior aos de 2019, enquanto que nos outros países desenvolvidos, a começar pelos Estados Unidos, este índice progrediu bastante”, resume Céline Antonin, economista sênior do Observatório Francês da Conjuntura Econômica (OFCE), de Paris, e especialista na zona do euro. "A Alemanha está claramente estagnada há cinco anos e hoje é difícil ver como ela vai enxergar o fim do túnel”, disse ela à RFI.
A concorrência americana depois da entrada em vigor do Inflation Reduction Act (IRA) nos Estados Unidos, sem que a Europa tenha reagido à altura para apoiar a sua indústria, acentuou esse quadro. Do outro lado, o avanço espetacular da China sobre o precioso setor automotivo, por meio dos carros elétricos, pegou Berlim de surpresa.
As companhias alemãs que deslocaram em peso sua produção para o país asiático privilegiaram joint ventures, com parcerias incluindo transferência de tecnologia – uma escolha que hoje se volta contra o próprio país.
"Os alemães tiveram as suas tecnologias copiadas em alguns setores e, uma vez que a China se apropriou dessas tecnologias alemãs, passou a reproduzi-la sozinha. No setor automotivo, ela ultrapassou a Alemanha a partir de 2023, e a Alemanha ainda é dependente de vários produtos chineses, como os componentes eletrônicos, diodos, circuitos integrados, o que amplia a sua vulnerabilidade”, nota Antonin.
Efeito Trump torna futuro mais nebuloso
Agora, o retorno de Donald Trump à Casa Branca, com seu America first, e a distribuição de tarifas de importação aos parceiros comerciais dos Estados Unidos, a situação fica ainda mais dramática. O Instituto de Economia Alemã de Colônia avalia que o "efeito Trump" poderá causar € 180 bilhões de prejuízos em quatro anos para o país.
"Tem uma parte considerável dos empregos alemães que dependem da indústria exportadora, e é por isso que a Alemanha promove tanto o livre comércio. Passarmos a ter um mundo mais fechado, com tarifas de importação, não é nada bom para ela”, observa a economista.
A vulnerabilidade energética alemã fez com que o país sofresse mais do que os vizinhos com os impactos da guerra na Ucrânia e os cortes de fornecimento de gás pela Rússia. Resultado: os preços de toda a cadeia produtiva aumentaram e não baixaram mais.
Em janeiro, em uma cena rara, empresários ocuparam o emblemático Portão de Brandemburgo, em Berlim, para alertar os candidatos a chanceler sobre o risco de “declínio" do país e pedir “reformas econômicas urgentes”. A queda dos preços da energia é uma das principais reivindicações.
"Os empreendedores estão na rua porque a situação está mais grave do que nunca. Os empregos e a prosperidade do nosso país estão em perigo”, disse um manifestante. "A Alemanha tem um enorme problema de competitividade. Há anos, as nossas advertências são ignoradas pelos políticos."
Investimentos públicos paralisados
Com discurso liberal, os conservadores do CDU são os favoritos – mesmo que, no horizonte, a vitória possa significar uma aliança com a extrema direita, em nome da governabilidade. O candidato...
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Na corrida mundial pela IA, UE aposta em proteção de dados para se diferenciar de excessos de concorrentes
2/11/2025
A expansão da inteligência artificial para os mais diversos campos torna a questão da regulamentação do seu uso cada vez mais urgente, em meio a uma concorrência mundial crescente. Espremida entre o controle estatal da China e a flexibilidade dos Estados Unidos, a Europa busca se diferenciar com uma IA protetora dos usuários – mesmo que este caminho a deixe para trás nesta corrida.
A União Europeia adotou em 2024 a legislação mais completa do mundo sobre a tecnologia. O “respeito da vida dos cidadãos” está no foco do texto do IA Act, que impõe transparência sobre o seu uso, exigências de normas para áreas consideradas sensíveis, como educação e segurança, e até proibições de uso da IA quando for contrário aos valores europeus, a exemplo do sistema de notação de pessoas que existe na China.
Enquanto isso, nos Estados Unidos, um dos primeiros atos da desregulamentação generalizada prometida pelo presidente Donald Trump foi reverter o frágil mecanismo que havia sido instaurado pelo ex-presidente Joe Biden em matéria de inteligência artificial.
Este foi um dos principais temas debatidos na Cúpula para a Ação sobre a Inteligência Artificial, realizada em Paris nesta segunda e terça-feira. “Nós apoiamos a regulação: como se tem dito, a IA é importante demais para não ser regulada, mas deve ser regulada de forma inteligente”, disse a diretora global de Políticas de Concorrência do Google, Astri Van Dyke, em um painel do Business Day, evento paralelo da cúpula. “Temos que ter uma visão dos riscos e analisar setor por setor. Os riscos da IA na saúde serão diferentes do da indústria, por exemplo”, complementou.
Já Adam Cohen, diretor de Impacto Econômico da OpenAi, considera que, neste momento de desenvolvimento da tecnologia, regras mais flexíveis favorecem o surgimento de novos players. “As regras e regimes de compliance podem criar obstáculos. Só para dar uma ideia de comparação, na OpenAI somos 2 mil colaboradores, o que é menos do que só o time jurídico do Google”, disse o executivo da criadora do ChatGPT. “Não temos o mesmo nível de recursos. O impacto que as obrigações podem ter é muito importante”, comentou.
Regulação poder preservar a concorrência
Solange Viegas dos Reis, diretora jurídica da OVHCloud, líder europeia em armazenamento de dados, afirma que um dos principais papeis da regulação é justamente proteger a concorrência justa. Representando um setor em que 70% do mercado é dominado por três big techs americanas (Amazon, Microsoft e Google), ela avalia que o mercado sozinho não garantirá essas salvaguardas.
“A regulação não é automaticamente sinônimo de freio à competição. Se ela for adaptada, ela pode ajudar à competição”, observa. “Hoje, o que se passa é que tem uma diferença muito grande de capacidade de desenvolvimento entre empresas americanas e europeias – as grandes empresas da tech são americanas e as europeias são muito menores. Mas podemos ver que a regulação pode ajudar todo o tecido industrial e econômico a se desenvolver. E temos um diferencial importante, na comparação com os competidores, que é a proteção dos dados e a soberania sobre eles”, destaca.
Solange compara as empresas de IA com as outras indústrias, dentre as quais muitas não se importam de recorrer ao trabalho infantil ou desrespeitar normas ambientais.
“Não é porque, em certos países, a IA é feita num faroeste que devemos aceitá-la. Sabemos que o mercado europeu é importante para várias empresas no mundo inteiro, incluindo as americanas”, salientou. “Como o nosso mercado é importante, nós podemos impor regras que permitam acessá-lo. Essas regras têm que permitir que a atividade econômica flua com boas condições, mas também podem impedir que pessoas que venham do faroeste apliquem os métodos delas na Europa.”
IA tem interesse em manter indústrias criativas
O presidente da Autoridade da Concorrência francesa, Benoît Coeuré, disse que o risco é a IA se tornar uma gigantesca indústria da exploração de dados, na qual as grandes...
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Acordo comercial entre Brasil e EUA pode avançar em meio a onda tarifária de Trump
2/6/2025
O presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, começa a cumprir as promessas de aumentar os impostos de importação aos principais parceiros comerciais do país – mas, ao mesmo tempo, sinalizou que poderia negociar com a China um acordo comercial. Este também poderia ser um caminho para a Brasil.
Em 2020, no primeiro mandato de Trump, Estados Unidos e Brasil assinaram um Acordo de Comércio e Cooperação Econômica (Atec, na sigla em inglês), para facilitar os trâmites burocráticos das transações. Desde então, um comitê busca aprofundar a redução de barreiras e ampliar a integração dos mercados, mas avanços significativos para a operacionalização do tratado não foram alcançados.
A próxima reunião está marcada para o segundo semestre. “Vai ser para discutir temas relacionados justamente a isso, simplificação alfandegária, que a gente vai precisar muito e os países vão ter que se adequar”, nota Arthur Pimentel, presidente do Conselho de Administração da Associação de Comércio Exterior do Brasil (AEB).
“Nós recebemos em outubro a OMA, Organização Mundial das Aduanas. Vejo tudo apontando para o Brasil e acho que está se desenhando um cenário muito favorável para a gente. Tem uma boa vontade do governo americano para dar continuidade a essas tratativas”, aposta.
Acordo não inclui tarifas
Como membro do Mercosul, Brasília não poderia assinar um tratado de livre comércio com os Estados Unidos sem o consentimento dos demais parceiros. O Apec não abrange tarifas, mas uma série acordos bilaterais podem ser visados, como de facilitação de comércio, de investimentos e liberalização de serviços – inclusive em setores estratégicos como tecnologia e telecomunicações, salienta Welber Barral, ex-secretário de Comércio Exterior (2007-2011) e especialista em Direito Internacional do Comércio.
“O que eu tenho ouvido em Brasília hoje é que o Brasil não quer ser lembrado por Trump, porque a experiência com México e Canadá vai causar muito problema para a economia desses dois países. E Trump tem negociado sempre de uma posição de muita força, de primeiro adotar medidas e depois passar para a negociação”, constata. “Mas já existem várias iniciativas que poderiam avançar, como a cooperação na área de defesa, existe um diálogo comercial entre o Mdic [Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio] e o Departamento de Comércio americano, para tirar barreiras não tarifárias. Todas essas iniciativas poderiam ter resultados mais abrangentes – se houver interesse do lado americano.”
Enquanto isso, Brasília se prepara para, cedo ou tarde, ser alvo dos disparos tarifários do presidente americano. Trump citou o Brasil como “um país que cobra muito” e, “se eles querem cobrar, vamos cobrar a mesma coisa”.
“Apesar da reclamação de Trump, a grande verdade é que o Brasil não tem tarifas particularmente altas contra os Estados Unidos. Ele importa muitos derivados de petróleo, equipamentos, à exceção do etanol, que os Estados Unidos reclamam que tem uma tarifa alta”, explica Barral.
A exposição do Brasil a eventuais retaliações também é bem menor do que a mexicana ou a canadense, que têm nos Estados Unidos o destino de até 80% de suas exportações. No caso brasileiro, esse número gira em torno de 15% e a balança comercial foi deficitária de 2009 a 2023 – ou seja, o Brasil importa mais do que exporta para os americanos.
Ainda assim, os Estados Unidos são o segundo maior parceiro do Brasil, atrás da China. As ameaças de Trump deverão levar o país a diversificar ainda mais o seu comércio internacional. “O Brasil terá a obrigação de buscar mercados alternativos, buscar exportar e expandir para outros mercados, fazer um esforço de financiamento e garantias para mercados mais arriscados, como da América Latina e África. E lembrando que o efeito não será o mesmo para todas as cadeias produtivas”, sublinha Barral.
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Ofensiva contra o Brics
O Brasil também está...
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Proteção ambiental está no foco de projetos financiados no mundo pela USAID, que Trump quer fechar
2/5/2025
A Agência Norte-Americana para o Desenvolvimento (USAID, na sigla em inglês) está na mira da extrema direita americana e mergulhou em um mar de incertezas milhares de projetos ambientais espalhados pelo mundo, financiados pelo organismo. A cooperação com organizações brasileiras é histórica e ajudou a desenvolver o conhecimento sobre a Amazônia.
Coube ao bilionário Elon Musk, antigo crítico da agência, anunciar que ela iria “fechar”. Na segunda-feira, os empregados da USAID receberam ordens por e-mail para não comparecerem aos seus escritórios. Antes, o presidente Donald Trump havia declarado que a entidade era administrada "por um bando de lunáticos extremistas” e avisou que os funcionários seriam “demitidos”.
A Agência dos Estados Unidos para o Desenvolvimento Internacional é uma entidade independente criada por um ato do Congresso americano, no auge da Guerra Fria, em 1961. Por décadas, foi um importante instrumento de soft power americano na América Latina e acusado de influenciar diretamente a política interna dos países beneficiados.
Nas últimas décadas, entretanto, passou a priorizar parcerias com organizações internacionais e não diretamente com governos. Como os Estados Unidos são o maior provedor de ajuda humanitária e de desenvolvimento do mundo, a ideia de que a agência possa fechar traz consequências devastadoras para organizações e para os países mais pobres, em áreas diversas como educação, saúde, governança ou proteção de minorias.
Orçamento maior do que muitos PIBs
O orçamento anual do organismo é maior do que o PIB de muitos destes países beneficiados: US$ 40 bilhões. A USAID emprega cerca de 10.000 pessoas, dois terços delas no exterior.
Cada vez mais, os projetos pelo mundo têm a preservação ambiental e a sustentabilidade como um pilar. “Existem programas diretamente dedicados às mudanças climáticas, ou seja, dinheiro que financia medidas de mitigação e adaptação em países em desenvolvimento. Mas além desses projetos específicos, quase todos os programas da USAID — por exemplo, aqueles dedicados à segurança alimentar ou à saúde global — têm um componente climático, simplesmente porque os efeitos do aquecimento global influenciam os resultados desses projetos”, salienta o diretor nos Estados Unidos do Instituto Ambiental de Estocolmo Ed Carr, ex-funcionário da USAID, em entrevista à redação de Meio Ambiente da RFI.
“Quando a USAID tenta melhorar a resiliência de agricultores africanos, diante das mudanças climáticas, essa também é uma forma de proteger o sistema alimentar global. Interromper este programa terá, portanto, um impacto indireto em cada um de nós”, afirma Carr. “O governo Trump deixou claro que está mirando programas de mudança climática em particular, porque acredita que o dinheiro não está sendo bem gasto. Portanto, o que fica claro é que os programas de mudança climática serão alvos específicos, independentemente do resultado da situação atual que vemos na USAID.”
Projetos no Brasil
No Brasil, a cooperação com a agência começou há 50 anos e, desde 2013, os projetos na Amazônia ganham destaque. A Parceria para Conservação da Biodiversidade na Amazônia é um exemplo, ao trazer uma abordagem holística, aliando proteção ambiental com capacitação das comunidades locais e inclusão social.
O site do projeto no Brasil agora está fora do ar, a exemplo de pelo menos 350 outros endereços ligados à USAID no mundo, conforme contagem da agência de notícias AFP. A agência ressalta que é “impossível” saber quando exatamente eles foram desativados e se foi por ordem expressa do presidente americano.
Outras organizações brasileiras que desenvolvem projetos financiados pela USAID são o Instituto Socioambiental (ISA), o Instituto Sociedade População e Natureza (ISPN), Instituto Ouro Verde (IOV), a WWF-Brasil e o Instituto de Manejo e Certificação Florestal e Agrícola (Imaflora).
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Desinformação sobre o PIX evidencia desafios à informalidade no mercado de trabalho brasileiro
1/29/2025
A onda de temor provocada por notícias falsas de que as transações por PIX passariam a ser tributadas no Brasil chamou a atenção para o problema crônico da informalidade do mercado de trabalho no país. Quase metade da população ativa encontra-se em situação irregular ou semirregularizada – um cenário que não apenas expõe esses trabalhadores à precariedade, como contribui para aumentar o rombo na Previdência Social.
No começo de janeiro, o governo anunciou a entrada em vigor de uma normativa da Receita Federal para incluir na fiscalização as transações realizadas por PIX acima de R$ 5.000, por pessoas físicas, e R$ 15.000 para empresas.
A medida visava sobretudo as somas de atividades milionárias dos setores de tecnologia. Mas o anúncio foi alvo de uma intensa campanha de desinformação de setores da oposição, que deixou apreensivos milhões de trabalhadores informais ou registrados como MEI (Microempreendedor Individual), e temeram ser alvo de impostos. O governo ressaltou que não mirava essas pessoas e nem aplicar novas taxas, mas o estrago estava feito.
Dados da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílio (Pnad), do IBGE, indicam que a informalidade disparou no Brasil na última década, entre o último trimestre de 2015 até o trimestre encerrado em novembro de 2024. O professor sênior da Faculdade de Economia da Universidade de São Paulo (USP) Hélio Zylberstajn ressalta alguns números: o de empregados sem registro cresceu 41% no setor privado e 51% no público, e o de autônomos registrados no MEI, portanto sem carteira assinada, subiu 28% no período.
"Você percebe que toda a parte informal expandiu em dois dígitos, a 20%, 30%. Um número muito interessante são os trabalhadores por conta própria, os self employed, que podem ter uma situação que os regulariza de alguma forma, o MEI. Essa categoria cresceu 58%”, afirma Zylberstajn. "A informalidade cresceu e essa semiformalidade explodiu. O retrato do mercado de trabalho é dramático”, constata ele, que também coordena o projeto Salariômetro da FIP (Fundação Instituto de Pesquisas Econômicas).
Informalidade x pleno emprego
O paradoxo é que o país desfruta há alguns meses do pleno emprego. No trimestre finalizado em novembro, o desemprego caiu a 6,1%, o mais baixo em 12 anos de Pnad. Mas, em paralelo, os dados da informalidade e inadimplentes nunca foram tão altos: somados, chegam a 47% dos ativos.
"A informalidade não cresceu por causa do PIX”, sublinha o professor. "São outras as razões: em parte, ela é tão grande por causa do nosso sistema tributário que é tremendamente injusto. Ele cobra imposto de renda de quem ganha acima de R$ 2,8 mil, menos do que a renda média do trabalho. Por isso que assustou tanta gente”, diz.
Daniel Duque, pesquisador sobre mercado de trabalho do Instituto de Economia da Fundação Getúlio Vargas (Ibre-GFV), também salienta este ponto. Para ele, os pagamentos por PIX apenas substituíram o que antigamente era já feito em espécie – e é natural que a Receita queira monitorar as transações. Porém, é o sistema tributário desigual, em que os ricos pagam proporcionalmente muito menos impostos do que os pobres, que acaba direcionando a arrecadação de impostos para o trabalho e o consumo.
"Essa discussão do PIX mostra que as pessoas têm muita resistência a pagar diretamente impostos, então o governo não cobra tanto imposto de renda – o percentual de arrecadação por imposto de renda no Brasil é muito abaixo dos países desenvolvidos”, explica. "Alternativamente, o governo cobra mais sobre o consumo, e assim as pessoas não percebem que estão pagando, ou então taxa diretamente sobre a folha salarial. Não é à toa que o empregado precisa ser muito qualificado para que valha a pena empregar”, nota Duque, que finaliza um doutorado em economia do trabalho na Norwegian School of Economics.
Desafio de integrar informais
Sete anos depois da última reforma trabalhista, que flexibilizou as relações laborais durante o governo de Michel Temer, uma pesquisa do Ibre-FGV...
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Fórum de Davos contrapõe guinada protecionista de Trump a neoliberalismo em transformação
1/21/2025
O Fórum Econômico Mundial acontece este ano em Davos em pleno processo de transformação da globalização e do neoliberalismo, corrente dominante no encontro das maiores fortunas globais no pequeno vilarejo suíço. Este ano, o evento ocorre na estreia do novo governo do presidente Donald Trump nos Estados Unidos, com a promessa de uma virada ainda mais protecionista e nacionalista da maior economia do planeta.
A 55ª edição do fórum começou, ironicamente, no dia da posse do líder republicano em Washington. Enquanto a cúpula econômica mundial em Davos discute a “colaboração na era da inteligência artificial” e à luz da crise climática, Trump exaltava o Make America Great Again e decretava o aumento das tarifas de importação no seu país e a retirada dos americanos do Acordo de Paris sobre o Clima.
A última vez que ele participou do fórum foi em 2020. Neste edição, o republicano vai se pronunciar à distância nesta quinta-feira (23), por videoconferência. É o discurso mais aguardado dos cinco dias do evento.
“Para os outros países, os capitais não americanos, é um momento de uma de dúvida muito grande para ver o que acontece. Não acho que há muito o que fazer ou que discutir com qualquer consequência no fórum desse ano”, avalia Alfredo Saad Filho, professor de economia politica internacional na Queen's University Belfast, do Reino Unido.
"Ficou completamente esvaziado: grandes lideranças que normalmente seriam importantes no fórum foram para a posse de Trump, prestando atenção no que realmente importa nesse momento. Então não é que o fórum seja completamente irrelevante, mas ele está em compasso de espera", diz.
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Saad Filho salienta que Trump carrega contradições importantes – se, por um lado, se mostra contrário à globalização ao impor barreiras ao comércio global, por outro defende a retomada da ideia de um "imperialismo americano", ao mencionar a anexação da Groenlândia, do Canadá e do Canal do Panamá.
O magnata nunca escondeu o certo desprezo pelo Fórum de Davos – que, apesar de ser denunciado pela esquerda mundial como um símbolo de poder dos ultrarricos sob o mantra do livre-comércio, é considerado por Trump como uma cúpula com viés alinhado aos democratas.
Extrema direita triunfou em meio a efeitos do neoliberalismo
O professor observa que a volta do líder republicano ao poder reflete mais uma etapa do longo processo de transformações do neoliberalismo, iniciadas com a crise financeira global de 2008 – e em um mundo cada vez mais fragmentado.
"De repente, se percebe de uma maneira muito clara que o neoliberalismo gera instabilidade, gera crise, austeridade e a piora das condições de vida para grande parte da população. Isso terminou por levar ao surgimento do que eu gosto de chamar de lideranças políticas autoritárias, espetaculares, o Donald Trump sendo um exemplo disso”, explica o professor, referindo-se ao surgimento de lideranças de extrema direita de fora do sistema político tradicional.
“Eles vêm com promessas de resolver as crises interligadas do neoliberalismo, de emprego, de renda, num contexto em que as forças políticas de esquerda, os social-democratas, tinham sido deslegitimadas e, em grande medida, devastadas anteriormente”, complementa Saad Filho.
'Oligarquias' americanas
O processo ganhou um novo impulso após a pandemia de Covid-19 e a a consolidação de um núcleo em torno das indústrias de tecnologia, energia e defesa, aliadas ao setor financeiro. Os dirigentes de algumas das principais gigantes de tech americanas preferiram participar da posse de Trump do que das reuniões em Davos – foi o caso de Mark Zuckerberg (Meta), Jeff Bezos (Amazon) Sundar Pichai (Google) e Tim Cook (Apple), além de Elon Musk, que integra o novo governo em Washington.
“A volta de Trump marcou o que o Joe Biden definiu, na semana passada, como o surgimento das oligarquias nos Estados Unidos”, relembra o pesquisador da...
Duración:00:06:45
UE agiliza pagamentos instantâneos, mas modelo como o PIX tende a jamais sair
1/15/2025
Desde 9 de janeiro, todos os estabelecimentos bancários da União Europeia são obrigados a receber e enviar transferências instantâneas de seus usuários – em mais um capítulo da modernização dos sistemas de pagamentos no bloco. Um modelo como o PIX brasileiro, entretanto, está longe de ser concretizado na Europa.
Nos países europeus, a maioria das transferências entre contas ainda são feitas por meio dos bancos ou aplicativos – devido, em grande parte, à resistência do sistema bancário a abrir mão dos custos destes serviços. A chegada dos bancos digitais obrigou os tradicionais a derrubar os valores cobrados e a agilizar os serviços, mas a oferta de pagamentos instantâneos operados por uma chave, como no Brasil, parece distante no continente europeu.
“Isso vai facilitar um pouco, mas não vai resolver o problema da chave. As transferências SEPA, por IBAN, servem como plataforma de pagamentos entre contas, e não entre pessoas físicas e contas, para pagar comerciantes”, explica Abdallah Hitti, administrador da Brapago Payments do Brasil. “O PIX tradicional, ou seja, um banco europeu oferecer uma conta com chaves, não vai ter.”
Demanda menor na UE
Outra dificuldade são as regulamentações europeias de proteção da privacidade: os clientes do bloco são avessos a comunicar dados confidenciais na hora de fazer uma transação financeira ou comercial, salienta Victor Warhem, macroeconomista especialista em finanças digitais e sênior fellow do Joint European Disruptive Initiative.
“Tem outros fatores de bloqueio. Não esqueçamos que o PIX foi adotado num país onde as pessoas tinham pouco acesso ao sistema bancário e os pagamentos com cartão não eram generalizados como aqui. Ou seja, havia demanda para uma solução que a Europa não necessariamente precisa”, nota. “Quando você pergunta para os consumidores europeus se eles estão satisfeitos com seus pagamentos atuais, a imensa maioria diz sim”, afirma o pesquisador.
A integração financeira europeia também teve avanços em 2024: 16 dos maiores bancos do bloco aderiram ao Wero, que reagrupa serviços nacionais de pagamentos instantâneos. Ficou mais fácil transferir e pagar usuários de diferentes países, embora uma integração generalizada não esteja no horizonte, afirma Abdallah Hitti. Ele dirige o serviço VoucherPay, focado no público brasileiro que deseja poder pagar com PIX na Europa, Asia e Oceania.
“Hoje temos na Suécia um sistema similar ao PIX, o Swish, que permite fazer pagamentos instantâneos entre celulares. Funciona muito bem, mas não foi ampliado para fora da Suécia por causa desse problema de confiança das pessoas em terem no celular uma chave conectada à conta”, indica Hitti.
Prioridade da UE é euro digital
Para o Banco Central Europeu (BCE), a prioridade é outra: viabilizar o euro digital até 2027. Três projetos estão sobre a mesa, desenvolvidos pelo Bundesbank alemão, a Banca d’Italia e a Banque de France.
“Contrariamente ao Brasil, onde o PIX foi elaborado em conjunto com o Banco Central, aqui a ideia do euro digital vai ser ter uma moeda de Banco Central para compras correntes – e acho que isso é um freio enorme para um projeto de pagamentos instantâneos aqui. As coisas devem avançar rapidamente para o euro digital”, destaca o pesquisador francês.
“O BCE vai fornecer aos bancos europeus e aos serviços de pagamentos uma infraestrutura de pagamentos de grandes volumes tokenizados. Depois, vai permitir que eles criem produtos tokenizados, entregues diretamente aos consumidores finais”, indica.
Victor Warhem lembra ainda que a ameaça de moedas alternativas como stablecoins, cotadas em dólar, leva a União Europeia a querer proteger o euro de qualquer instrumentalização dos sistemas de pagamentos pelos Estados Unidos. “Na Europa, não podemos esquecer que tem uma questão de soberania e de proteção do próprio euro e, no fundo, é o que mais motiva o Banco Central Europeu, embora ele não fale claramente disso”, observa o especialista.
Duración:00:06:02
Economia mundial entrará em 2025 em suspenso à espera do “imprevisível” Trump
12/25/2024
O ano de 2025 chega recheado de incertezas na economia global, pontuadas pela guinada protecionista prometida por Donald Trump nos Estados Unidos, a partir de janeiro. No Brasil, a expectativa é se o governo vai conseguir convencer os agentes econômicos sobre a solidez fiscal do país, em meio a uma disparada dos juros ao patamar mais alto em uma década.
Instituições como o Fundo Monetário Internacional (FMI) e a OCDE preveem que o crescimento do PIB mundial permanecerá estável, acima de 3%. O economista Renato Baumann, do Instituto de Pesquisas Econômicas Aplicadas (Ipea), resume o quadro para o começo do ano: com a volta de Trump, a única certeza é um conjunto de incertezas.
“A questão é que ele é imprevisível. Muito provavelmente a gente vai ver, nos primeiros meses, uma proatividade de mandar imigrantes ilegais de volta para os seus países e um discurso contra o multilateralismo, mas eu não afastaria a possibilidade de uma acomodação a médio prazo”, pondera o pesquisador. “Os custos de adotar tarifas, como ele fala, são custos que não serão menores”, salienta.
O futuro presidente americano promete importar menos da China, e o país asiático deve crescer menos em 2025. Pequim já planejou a sua reação e vai se voltar para dentro: o governo chinês anunciou um ambicioso plano de estímulos para aquecer o consumo, aumentar os investimentos e enfrentar a crise imobiliária crônica.
Este cenário tem tudo para afetar as importações do Brasil, uma vítima colateral da retomada da provável guerra comercial entre as duas maiores potências globais. Mas também pode representar uma oportunidade para as vendas de minério de ferro, que hoje respondem por cerca de um quarto da pauta de exportações brasileiras para o país.
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Dólar alto vai continuar
Reginaldo Nogueira, economista e diretor nacional do Ibmec, ressalta ainda que a volta de Trump favorece a moeda americana e a China pode buscar fortalecer o yuan em contrapartida. Resultado: a cotação do dólar não deve baixar tão cedo em relação ao real.
“Teremos um período em que o dólar vai continuar forte, e os países vulneráveis, entre eles o Brasil aparece disparado em 2025, serão aqueles que vão sofrer mais”, observa. “A pressão cambial sobre o Brasil vai continuar porque nós estamos com a jugular exposta, com déficit fiscal e déficit externo, simultaneamente. Isso deixa o país como um alvo muito claro para pressões cambiais.”
No cenário interno, 2025 começa com desconfiança sobre os rumos da política fiscal, depois que o governo anunciou um pacote de ajuste considerado tímido demais, ao prever R$ 70 bilhões de economias em dois anos. Nogueira vê sinais de uma economia superaquecida pelo consumo, que têm levado o país a se afastar cada vez mais da meta de inflação, de 3%.
Choque de juros
Para frear esse ciclo, o Banco Central antecipou que a subida da taxa básica de juros não deve parar tão cedo. O atual índice em dezembro, de 12,25%, alça o Brasil ao país à posição de segundo maior juro real do mundo, atrás apenas da Turquia, e à frente da Rússia.
“Acho que a pergunta que fica para 25 é o quão alto os juros precisarão chegar para que a gente tenha um cenário de inflação mais estável. Isso vai depender fundamentalmente da política fiscal”, afirma o diretor do Ibmec. “Se o governo seguir com um ajuste de 30 bilhões em 2025, provavelmente os juros terão que ir para perto de 15%, isso vai despencar o investimento privado e a gente vai ter uma situação, em termos de crescimento, muito mais complicada – não só em 25, mas também em 26”, antecipa.
A previsão atual de crescimento brasileiro no próximo ano gira em torno de 2%, bem abaixo dos 3,3% projetados para 2024. Alguns economistas, como na Fundação Dom Cabral, avaliam que um quadro de estagflação pode estar se desenhando – ou seja, crescimento fraco, inflação elevada e desemprego em alta. Mas Renato Baumann, do Ipea, prefere olhar o futuro...
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Os setores na França que não veem a hora de o acordo comercial com o Mercosul sair
12/11/2024
A assinatura do acordo de livre comércio entre os países do Mercosul e da União Europeia causa, oficialmente, reações negativas da França, mas também leva diversos setores econômicos do país a celebrar. Industriais em variadas áreas e fabricantes de produtos agroalimentares, como vinhos e queijos, não veem a hora de o tratado entrar em vigor.
Lúcia Müzell, da RFI em Paris
O barulho dos agricultores franceses, que prometem continuar a bloquear a ratificação do acordo, abafa o entusiasmo dos produtores de vinho – ansiosos pela ampliação dos mercados de exportação para países onde o consumo está em plena ascensão, como na América Latina. Jean-Marie Fabre, presidente do Vignerons Indépendants de France, federação sindical que representa 60% da produção francesa e 65% das receitas, ressalta que, enquanto a União Europeia reluta, países produtores como a Austrália, os Estados Unidos e a África do Sul aceleram os acordos comerciais para diminuir os impostos sobre os vinhos exportados.
"Eu peço que a gente assine este acordo, porque o dia em que conseguirmos baixar a zero as tarifas alfandegárias, que hoje são de 27% para os nossos produtos, nós ganharemos com certeza uma grande participação de mercado. Poderemos melhorar o desempenho econômico do nosso setor, mas também da França”, avalia.
A Vignerons Indépendants reúne pequenos, médios e grandes produtores, para os quais as exportações representam cerca de 35% das vendas. Noventa por cento deles vendem para outros países da União Europeia e 81% para mercados externos ao bloco.
Fabre cita o exemplo do acordo em vigor com o Japão, que permitiu aos viticultores franceses aumentarem 10% do volume de exportações ao país asiático. A expectativa é ainda mais favorável com os latino-americanos e, em especial, o Brasil.
“O Brasil é um país onde o consumo avança a um ritmo de dois dígitos, de 12%, 15%. O Paraguai e o Uruguai estão bem mais atrás. Eu acho que, num primeiro momento, o impulso vai ser relativamente fraco em termos de volume, mas nos próximos 10 a 15 anos, será uma zona do mundo importante de consumo de vinhos e destilados”, espera. "Nós percebemos que é nestes mercados emergentes que a França não deve perder mais tempo e ficar atrasada ou prejudicada por regras de comércio diferentes dos seus concorrentes.”
Vinho, carro-chefe do setor agrícola francês
O setor vinícola é o que apresenta, de longe, o melhor desempenho da agricultura francesa. O vinho tem um peso importante no comércio exterior do país: situa-se logo atrás do setor aeronáutico e em pé de igualdade com o luxo, duas atividades que também festejam a assinatura do acordo comercial com o Mercosul, assim como as indústrias química, automotiva, farmacêutica e cosmética.
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No ramo alimentar, os fabricantes de produtos transformados e laticínios se somam à lista, mas a rusga dos pecuaristas contra a carne latino-americana leva os produtores de derivados do leite a serem mais discretos quanto à aprovação do acordo. Quarenta mil toneladas de queijo e 10 mil de leite em pó passarão a entrar no Mercosul com imposto zero, dez anos após a entrada em vigor do tratado.
“O princípio de um acordo é que seja olhado em uma escala global. Não podemos olhar uma corporação em particular, senão nunca vamos assinar nada, e estou bastante persuadido que, no fundo, o governo francês sabe que este tratado seria benéfico para França”, indica o economista especialista em comércio internacional Jean-Marie Cardebat, professor da Universidade de Bordeaux. "Neste momento, a política francesa está bastante lamentável e por razões de cálculos eleitorais mesquinhos, vamos derrubar um acordo que é extremamente importante para a economia francesa”, lamenta.
Acordo é equilibrado e favorece os dois lados, diz professor
A volta de Donald Trump ao poder nos Estados Unidos, trazendo com ele o aumento das tarifas de importação...
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Políticas de igualdade de gênero são chave para frear queda da fecundidade no mundo
12/4/2024
Em dois terços do planeta, a renovação de geração não está garantida – a queda da natalidade não é mais um problema apenas nos países ricos, mas se generaliza pelo mundo e atinge até os países em desenvolvimento. Especialistas alertam: a aceleração das políticas de igualdade de gêneros é uma das chaves para combater essa tendência e evitar que o envelhecimento das populações esvazie a força de trabalho ativa e vire uma bomba nos orçamentos públicos.
Há dois séculos, a queda da mortalidade levou à diminuição da fecundidade nos países do norte – uma evolução que agora se replica em todos os lugares do planeta.
“É um movimento generalizado, que leva a humanidade a mudar o seu regime demográfico. Os casais desejam ter menos filhos para garantir a eles uma vida melhor do que a que eles próprios tiveram, uma vida de qualidade”, explicou o especialista francês Gilles Pison, conselheiro da direção do Instituto Nacional de Estudos Demográficos da França e autor de Atlas da População Mundial (tradução livre). “Em lugar nenhum do mundo é mais possível ter seis ou sete filhos e que todos possam frequentar boas escolas, tenham diplomas e uma boa profissão”, esclareceu, ao programa Débat du Jour, da RFI.
Atualmente, quase 70% da população mundial vive em um país onde a taxa de fecundidade por mulher é inferior a 2,1 crianças, segundo a ONU. A média mundial é um pouco acima, de 2,25, puxada pelos índices ainda elevados em regiões da África, Oceania e Ásia. Mas também nestes lugares, assim como nas Américas, a tendência é de queda até o fim do século, depois que a população global atingir o seu pico em 2080.
O economista David Duhamel, professor-associado da Sciences Po Paris, salienta que o processo de transição demográfica acompanha o desenvolvimento econômico de um país. “Depende da urbanização – na cidade, fazemos menos filhos do que no campo – e da educação – as adolescentes não pensam muito em filhos quando elas estão no ensino médio, e ainda menos quando chegam à universidade. O que é interessante, nos últimos anos, é que o desenvolvimento demográfico está andando muito mais rápido do que o desenvolvimento econômico”, indicou. “Estamos vemos países que ainda são emergentes, como a Tailândia, terem índices demográficos semelhantes aos de um país como a Alemanha”, afirmou.
Como relançar a fecundidade?
Duhamel sublinha que o mundo em envelhecimento demanda um novo olhar sobre as pessoas com mais de 60 anos, que devem ser cada vez mais ser vistas como um recurso para a economia, e não um fardo, e sobre as minorias em idade economicamente ativa, incluindo os imigrantes.
Já as pistas para relançar a fecundidade passam pela diminuição das desigualdades e por políticas de habitação que viabilizem o projeto de ter filhos de jovens casais nas zonas urbanas, menciona o economista.
A velocidade com que países emergentes e em desenvolvimento começaram a ver os seus índices de natalidade cair surpreendeu especialistas – um fenômeno diretamente ligado ao ingresso e à ascensão das mulheres no mercado de trabalho, frisou Duhamel.
“A escolha de ter um filho sempre foi uma escolha econômica, só que antes as mulheres pagavam exclusivamente por essa escolha, em silêncio. Elas não aceitam mais isso, não aceitam mais não compartilhar essa conta, no trabalho como em casa”, salientou. “Hoje elas têm mais escolhas – e isso é formidável: podem escolher dizer não, escolher ter uma carreira ou se retirar dessa divisão desigual sobre a maternidade. O caminho para reencontrarmos a fecundidade é pelo compartilhamento mais igualitário possível do preço de ter um filho”, avalia.
Maior equilíbrio também em casa
Assim, alguns países como a Coreia do Sul, que não aceleraram as políticas de apoio à carreira das jovens mães, veem sua natalidade despencar ao índice crítico de 0,6 criança por mulher. Isso significa que, estatisticamente, seis pessoas são substituídas por apenas uma criança sul-coreana atualmente.
Não à toa, as nações europeias com maior taxa de...
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Críticas de CEO do Carrefour à carne brasileira ilustram ‘falta de visão’, em meio a crise do varejo na França
11/26/2024
O impacto negativo dos comentários do CEO do Carrefour, Alexandre Bompard, sobre a carne produzida no Mercosul pode custar caro para o grupo, que tem no Brasil o seu maior mercado fora da Europa. Há dois anos, ao celebrar a compra do concorrente BIG e quase dobrar a presença no país, Bompard dizia que “o futuro do grupo será escrito, em grande parte, no Brasil e na América Latina”.
Lúcia Müzell, da RFI em Paris
A escolha estratégica de apostar as fichas no país emergente se deu em um momento em que o modelo de hipermercados entrou em crise na França. “O Brasil está, mais do que nunca, no coração do grupo”, disse o CEO em junho de 2022. A aquisição do BIG do Walmart levou o Carrefour a se tornar o maior empregador privado no Brasil, com 130 mil funcionários.
"Globalmente, o Brasil é extremamente importante para o Carrefour, principalmente num momento em que ele enfrenta questionamentos sobre o modelo dos hipermercados no mercado francês, e que funcionam bem no Brasil. O país é um elemento essencial para o desenvolvimento da empresa, ainda mais que o grupo perdeu mercados no exterior nos últimos anos", afirma o pesquisador Jean-François Notebaert, professor de gestão da Escola de Administração da Universidade da Borgonha. "Acho que Bompard quis confortar os agricultores franceses, mas não teve uma visão internacional do grupo", avalia.
A atuação no Brasil representa um quinto do faturamento total do grupo francês, conforme balanço do terceiro trimestre. Marcos Gouvêa, um dos maiores especialistas da área do país, concorda que faltou visão para o executivo francês.
"Nesse processo que nós temos vivido, de desglobalização do varejo físico, com o crescimento do varejo digital e a metaglobalização do varejo digital, a representatividade do mercado brasileiro mereceria, no mínimo, muito mais reflexão antes de uma manifestação como foi feita", comenta Gouvêa. "Fica fácil ver quem sai ganhando: são os concorrentes do Carrefour".
O Brasil é o maior produtor mundial de carne e abastece também as unidades da rede francesa em outros países do mundo. Com os comentários, Bompard acabou preso na própria armadilha.
"A comunicação dele também causa problemas no sentido de que Bompard considera que esta carne não corresponde às normas do mercado francês, mas e os outros países europeus nos quais Carrefour está implantado, como Portugal, Espanha, Itália ou Polônia? Ele vai continuar vendendo esta carne que ele considera não corresponder às normas francesas?", questiona Jean-François Notebaert.
França quase não compra carne brasileira
Nos últimos anos, o mercado europeu se tornou menos relevante para as vendas brasileiras de carnes, em detrimento do chinês. A União Europeia compra menos de 4% do volume exportado, e a França responde por uma quantidade insignificante, de 0,66% do total vendido para a UE.
O bloco europeu permanece uma potência exportadora de proteína animal, e não o contrário. Na carne bovina, ainda mais: 85% do que é consumido na França tem origem no próprio bloco.
Ou seja, as declarações de Bompard buscavam confortar um mercado nacional que praticamente já não consome carne brasileira. O CEO parece ter esquecido deste contexto quando prometeu que não venderá nos supermercados na França carne proveniente dos países do Mercosul – Brasil, Argentina, Uruguai e Paraguai –, mesmo se o acordo comercial entre a União Europeia e o bloco sul-americano for ratificado e baratear o custo destes produtos. Na sequência, outra grande rede varejista francesa, a Intermarché – que não atua no Brasil – também assumiu o mesmo compromisso.
A tomada de posição de Bompard enfureceu produtores, frigoríficos, consumidores e até o governo brasileiro, em um movimento de união bastante raro em torno do setor. O ministro da Agricultura, Carlos Fávaro, disse que Brasília “não vai admitir” que a qualidade da carne brasileira seja questionada. O presidente da Câmara dos Deputados, Arthur Lira, acrescentou que espera “uma resposta clara” do Congresso,...
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Na Europa, nos EUA ou no Brasil, falta mão de obra para a transição energética
11/13/2024
Enquanto o mundo se mobiliza para promover a economia de baixo carbono, falta mão de obra qualificada para realizar o isolamento térmico dos prédios, fabricar veículos elétricos ou para desenvolver, instalar e manter painéis solares e parques eólicos. Apesar do futuro promissor, na Europa, nos Estados Unidos ou no Brasil a formação de profissionais ligados à transição energética ainda é insuficiente e não dá conta da demanda crescente.
Em 2023, o setor gerou um recorde de 2,5 milhões de empregos no mundo, segundo a Agência Internacional de Energias Renováveis (Irena, na sigla em inglês) e a Organização Internacional do Trabalho (OIT). A alta representa 18% a mais de vagas em apenas um ano, chegando a 16,2 milhões de trabalhadores – principalmente na China, em plena disparada da indústria fotovoltaica para a energia solar, da qual é líder mundial.
A Agência Internacional de Energia (AIE) antecipa que, até 2030, 30 milhões de vagas deverão ser preenchidas nestas indústrias em todo o planeta. Não é diferente no Brasil, onde a parte das fotovoltaicas quadruplicou e hoje responde por 20% da matriz elétrica brasileira. O setor gerou mais de 1,4 milhão de empregos desde 2012, de acordo com a Associação Brasileira de Energia Solar Fotovoltaica (Absolar).
“A tendência é continuar crescendo. Algumas projeções indicam que a solar fotovoltaica vai representar 50% da nossa matriz elétrica. Mas a gente percebe uma escassez de mão de obra qualificada – não somente para cargos de gestão, como para a fábrica, para a instalação dos sistemas, por profissionais que sejam formados para isso”, afirma Bárbara Rubim, vice-presidente da entidade.
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“Num cenário de médio prazo, o setor de energia vai demandar cada vez mais um profissional com um perfil plural, que consiga entender a parte técnica, mas também tenha uma visão mais ampla de desenvolvimento e de país – até para conseguir pensar melhor o futuro das empresas num setor, e também num país, que têm mudado tanto”, salienta.
Fuga de cérebros
Rubim reconhece que a escassez de profissionais desacelera o potencial de desenvolvimento das renováveis no país. Outro problema é a fuga de cérebros: num contexto em que sobram empregos na área nos países ricos, como nos Estados Unidos, o Brasil nem sempre têm conseguido segurar os seus talentos.
“A fuga de cérebros se torna um problema sobretudo quando a gente olha a pesquisa e desenvolvimento, que já é uma dor crônica do nosso país. Sem dúvida alguma, a reindustrialização verde também perde um pouco de força”, indica a vice-presidente da Absolar.
Na Alemanha ou na França, potências europeias, as empresas buscam, ainda nas universidades e em cursos técnicos, os formandos nestas áreas. Raphael Ameslant, funcionário de uma multinacional de parques eólicos offshore, também dá aulas no Instituto Universitário de Tecnologia de Saint Nazaire, na Bretanha, onde aproveita para recrutar futuros funcionários.
“Sempre precisei de técnicos em manutenção e agora está complicado de encontrar bons. Tenho buscado me envolver nos cursos para poder, ao mesmo tempo, buscar estudantes que poderão se tornar técnicos”, disse a Justine Fontaine, da RFI. “Todos aqui já têm contratos assinados.”
Faltam alunos
O planejamento da França em matéria de redução de emissões de gases de efeito estufa dá respaldo a quem apostar nesta área: a perspectiva do país é de pelo menos triplicar a produção de energia eólica no solo ou no mar, nos próximos 10 anos. Hoje, entretanto, o interesse dos estudantes ainda é baixo.
“Fiz um cálculo rápido e isso representa oportunidades para cerca de 600 pessoas por ano, apenas na área de exploração e manutenção. Mas neste ano, teremos apenas 12 diplomados aqui”, lamentou Patrick Guérin, diretor do curso. “Nós ampliamos a nossa capacidade das turmas em 2024, mas o número de candidaturas não subiu. Não compreendo muito bem por quê.”
Para...
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Eleições americanas: entre Trump e Harris, qual favorece mais a economia do Brasil?
10/23/2024
Na reta final antes das eleições presidenciais americanas, os rumos da maior economia do planeta impactam o Brasil, que tem nos Estados Unidos o seu segundo maior parceiro comercial. Os fluxos internacionais de investimentos e as taxas de juros e de câmbio também são influenciados diretamente pelo que acontece no país, que em 5 de novembro vai escolher entre a continuidade, representada pela democrata Kamala Harris, ou a volta do republicano Donald Trump à Casa Branca.
Lúcia Müzell, da RFI em Paris
Na política, dois projetos antagônicos se enfrentam nas urnas. Na economia, nem tanto: os dois candidatos pretendem estimular a atividade econômica, uma por meio mais gastos públicos, com transferência de renda e estímulos para setores como a inovação e a sustentabilidade, e o outro por cortes de impostos em favor das empresas.
A maior diferença é que Donald Trump assume o viés protecionista do seu programa de governo: planeja impor taxas pesadas sobre determinadas importações, que chegariam a até 60% sobre os produtos fabricados na China. No seu primeiro governo, o republicano lançou uma guerra comercial com o concorrente asiático e adicionou 25% de sobretaxas às mercadorias chinesas.
Um eventual segundo mandato Trump tende a ser ainda mais protecionista, avalia Luís Otávio Leal, economista-chefe da G5 Partners, em São Paulo – e o Brasil estaria à mercê das consequências indiretas dessas medidas:
“Tem estudos que mostram que o crescimento da economia chinesa poderia reduzir 2 pontos percentuais. Qualquer coisa que aconteça com a China acaba tendo impacto sobre países emergentes exportadores de commodities”, afirma. “Eu acho que por conta desse aspecto específico, a Kamala Harris seria mais favorável para o Brasil”, avalia Leal.
Comércio bilateral
O impacto direto na relação bilateral é menos claro. Os Estados Unidos são o segundo principal destino das exportações brasileiras, incluindo alguns itens industrializados como aço e laminados, que já foram alvo de alta de tarifas alfandegárias no primeiro governo Trump. Mas se novas medidas se concentrarem na China, poderia haver espaço para aumentar a participação brasileira no mercado americano, atualmente de apenas 1,2%, segundo números da ApexBrasil (Agência de Promoção de Exportações e Investimentos).
Em 2023, a corrente de comércio foi de quase US$ 75 bilhões – valor que representa uma pequena fração das transações americanas, de mais de US$ 7 trilhões. “O Brasil está longe de ser um parceiro super-relevante para os Estados Unidos. Antes do Brasil, é muito mais importante China, Europa, México, Canadá, países do lado dos Estados Unidos”, destaca o economista William Castro Alves, estrategista- chefe da corretora Avenue, em Miami. “Muito se fala que o Trump pode ser ruim e a Kamala pode ser mais favorável, mas dentro da pauta dos candidatos, seja quem quer que seja e mesmo se for o Trump, o Brasil não está na prioridade. Quando o Trump fala em ‘make America great again’, ele está muito mais se endereçando à China e ao próprio México”, lembra.
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O Brasil vende principalmente matérias-primas como petróleo bruto, ferro e aço, café e celulose, além de aeronaves, e compra dos Estados Unidos produtos industriais e relacionados à energia, como combustíveis refinados e gás natural, ou ainda fertilizantes. Também importa aeronaves e instrumentos médicos.
Os americanos são, há mais 10 anos, os principais investidores estrangeiros no Brasil, responsáveis por um quarto do total de investimentos estrangeiros diretos no país. Uma vitória de Kamala Harris tende a manter este status quo, nota Luís Otávio Leal.
“Ela caiu meio de paraquedas na campanha. Eu acho que só mais do meio para o final do mandato é que ela imprimiria uma marca mais personalista dela, e a gente não sabe qual seria”, pontua o economista-chefe da G5 Partners. “Ela foi uma vice-presidente apagada e a gente realmente não sabe o...
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Sob impulso russo, Brics aceleram pagamentos sem dólar, mas moeda própria ainda é sonho distante
10/16/2024
Anfitriã da cúpula do Brics este ano, a Rússia quer aproveitar a reunião de chefes de Estado dos países emergentes para impulsionar os projetos de sistemas financeiros alternativos ao dólar. A criação de uma moeda única do bloco, entretanto, ainda é um sonho distante, que esbarra na grande assimetria econômica e geopolítica entre os seus integrantes.
Os líderes do Brics se reunirão em Kazan, no oeste russo, na próxima semana, e discutirão diferentes projetos de mecanismos financeiros alternativos ao dólar no comércio intrabloco: o Brics Pay, equivalente à plataforma internacional de pagamentos Swift, o Brics Bridge, sistema baseado em blockchain que interligaria os respectivos bancos centrais, e a eventual moeda comum dos Brics.
"A ideia é se liberar de algumas amarras que, para eles, não têm mais muita razão de existir, dado o peso econômico destes países. Eles veem como algo quase irracional: por que deveríamos ainda precisar tanto do dólar para as nossas transações entre nós, entre Brasil e China, por exemplo?”, afirma Carl Grekou, economista especialista em finanças do Centro de Estudos Prospectivos e de Informações Internacionais (CEPII), em Paris. "Para muitos deles, o aspecto antidólar não conta tanto quanto o objetivo de apenas simplificar as coisas. Mas por trás disso tudo, tem a Rússia que claramente quer forçar a barra, afinal ela é alvo de sanções."
Desafio da expansão do Brics
Até agora, 32 países confirmaram presença no evento, na continuidade do processo de abertura do grupo iniciado na última cúpula, quando cinco novos membros se associaram oficialmente ao Brics – Emirados Árabes Unidos, Arábia Saudita, Irã, Egito e Etiópia.
A expansão complexifica ainda mais um projeto que já não era fácil de concretizar: se, por um lado, os aspectos técnicos são relativamente simples de viabilizar, a coesão interna de países tão diversos e apegados à sua soberania é uma barreira importante a ser superada.
"Mas eu acredito que, dentro de um horizonte de alguns anos, se tenha um avanço considerável para intensificar essas transações. Estes exemplos têm uma base técnica que já é bastante controlável, já se tem um domínio dessas técnicas”, destaca Marcelo Milan, do Departamento de Economia e Relações Internacionais da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFGRS).
"Resta a questão do direcionamento, de intensificar os fluxos em uma direção ou outra, para que o bloco possa criar mecanismos para que os arranjos de pagamentos sejam feitos cada vez mais com referência nas moedas nacionais e, se um dia for possível, nessa moeda comum", aponta Milan.
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Peso desproporcional da China
O maior problema rumo à moeda própria é que pressuporia uma preponderância do yuan chinês, dado o peso desproporcional de Pequim dentro do grupo. A maioria dos países rejeitaria a ideia de assumir o yuan como principal referência e em especial a Índia, garante o pesquisador Julien Vercueil, ligado ao Departamento de Comércio Internacional do Instituto Nacional de Línguas e Civilizações Orientais (Inalco) da França.
“Envolve muito engajamento político e econômico, a possibilidade de terem de enfrentar choques assimétricos, de viabilizarem grandes transferências de riquezas de um país para o outro. Ainda estamos muito longe desse tipo de configuração dentro dos Brics, sem mencionar o fato de que eles não estão nada sincronizados nos seus ciclos econômicos, ao contrário do que temos na Europa com o euro, por exemplo”, resume. "Ou seja, eles teriam problemas econômicos insuperáveis para adotar esta moeda.”
Especialista na economia russa, Vercueil avalia, entretanto, que os Brics tentarão passar como sendo já moeda própria os outros dois projetos mais avançados – para os quais o sistema Cips chinês parece servir de modelo. O Cips (China International Payement System) já começou a se interligar aos bancos centrais de alguns países do grupo de...
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Meca da moda, França vive onda de falências de marcas prêt-à-porter
10/2/2024
A fast fashion no mundo globalizado derruba algumas das marcas mais tradicionais do prêt-à-porter da França, berço de ícones da moda mundial. A crise no setor não vem de agora – desde o início dos anos 2010, as fabricantes francesas de vestuário e calçados sofrem com a concorrência do comércio online, ao qual demoraram a se adaptar.
A pandemia e os novos modos de consumo que dela decorreram aceleraram uma tendência de declínio que já estava instalada no país, revela um estudo do Instituto Nacional de Estatísticas e Estudos Econômicos (Insee). Em 2020, as vendas de roupas no país despencaram 22,6% e as de calçados, 19,8%, ao mesmo tempo em que o varejo em geral só recuou 2,5%. Na sequência, o crescimento das vendas se manteve inferior a 1%.
Este contexto, afirma o Insee, explica a queda brusca do número de lojas no país: de -18% das butiques de roupas e -26% das de calçados, entre 2014 e 2021. “Tem uma correção de mercado que se opera desde 2013. Ela continua e, infelizmente, não temos razão para pensar que ela terminou”, constata Gildas Minvielle, diretor do Observatório Econômico do Instituto Francês da Moda.
O especialista salienta que a moda francesa demorou a acreditar na força do comércio online – e perdeu tempo ao focar os investimentos em novas lojas físicas, em vez de no desenvolvimento de sites modernos. Depois, os anos de inflação alta e queda do poder aquisitivo levaram os consumidores a serem mais sensíveis ao fator preço.
O golpe final veio da China, com a chegada avassaladora das plataformas Shein e Temu no mercado europeu, desafiando os valores praticados pelas marcas de fast fashion bem implantadas no bloco, como a sueca H&M, as espanholas Zara e Mango e a irlandesa Primark.
“Quando vemos atores como Shein, que chegam e tomam conta do mercado de uma forma muito agressiva, deveríamos poder controlar melhor o fato de que os consumidores aqui não tenham de pagar direitos de importação. Isso não é normal”, aponta Minvielle. “Mas, para ser totalmente honesto, não tenho certeza de que isso mudaria alguma coisa, até porque a Shein não é única que derrubou os preços.”
Num contexto de concorrência cada vez mais feroz, na França o prêt-à-porter de baixo e médio custo é o mais atingido, vítima direta desta nova configuração. Redes como Camaïeu, Kookai, Naf-Naf, Pimkie e GoSport ou faliram, ou foram obrigadas a só operar pela internet. No ramo calçadista, as tradicionais André e San Marina enfrentam o mesmo destino.
Roupas de segunda mão já pesam no mercado
A emergência do fenômeno das compras de segunda mão, em lojas físicas como pela internet, também já impacta o desempenho do mercado de roupas e calçados novos. As vendas de usados pesavam, em 2022, entre US$ 100 e US$ 120 bilhões, em nível mundial, de acordo com um estudo da consultoria Boston Consulting Groupe (BCG) realizado a pedido da plataforma francesa Vestiaire Collective, um dos principais nomes da revenda de segunda mão no país. O volume representa três de 3% a 5% do total do setor e triplicou desde 2020. Segundo este relatório, nos próximos anos, as compras de peças usadas poderão atingir 40% do mercado, impulsionadas pelos jovens.
Nos países europeus, a faixa etária de até 30 anos já se acostumou a só comprar em brechós ou em plataformas especializadas, em busca de preços mais baixos e peças exclusivas, mas também por preocupação com o impacto ambiental do consumo. Numa tentativa de se adaptar à tendência, a maioria das grandes lojas francesas – entre elas a famosa Galeries Lafayette – instalou um “canto das usadas”. No espaço, as clientes podem comprar e revender as suas peças da marca.
Aposta na qualidade francesa
Gildas Minvielle avalia, entretanto, que o prêt-à-porter novo ainda tem dias promissores pela frente, à condição de apostar na qualidade e em subcategorias mais especializadas, como moda sustentável, marinha ou o chamado luxo acessível.
“Não são volumes como os da Camaïeu, da Zara ou da H&M, claro. Mas temos muitas marcas fortes em...
Duración:00:05:54
Lei antidesmatamento e queimadas podem ser ‘bola da vez’ para manter acordo UE-Mercosul travado
9/25/2024
O Brasil tenta acelerar as negociações do acordo comercial entre a União Europeia e o Mercosul até o fim deste ano. Mas do lado dos europeus, dois argumentos ligados à atualidade têm potencial de continuar travando a finalização do texto: a entrada em vigor de uma lei antidesmatamento importado no bloco, prevista para janeiro de 2025, e os incêndios florestais em curso em diversas regiões brasileiras.
Lúcia Müzell, da RFI em Paris
O tema tem sido evocado pelo Itamaraty e o próprio presidente Luiz Inácio Lula da Silva, em conversas com Ursula Von der Leyen, presidente da Comissão Europeia, e Olaf Scholz, chanceler da Alemanha – país favorável ao tratado. A série de queimadas nos biomas brasileiros se tornam um argumento a mais para aqueles que se opõem há anos à ratificação do texto na Europa, em especial o setor agrícola.
“O que está acontecendo no Brasil quase que justifica a regulação europeia sobre o desmatamento. Eu não a considero como um instrumento protecionista. Qualquer regulação pode ser usada de uma maneira protecionista, mas eu acho que ela tem uma motivação legítima ambiental, climática”, alega Pedro da Motta Veiga, diretor do Centro de Estudos de Integração e Desenvolvimento (Cindes), focado em política externa brasileira.
“Na ausência de algum tipo de regulação multilateral ou acordada entre os países, eu entendo que a União Europeia tenha resolvido estabelecer um papel pioneiro de estabelecer uma legislação unilateral relativa às importações para os seus países-membros”, analisa.
Bloqueio permanente
A última rodada oficial de negociações do acordo foi realizada em Brasília, no começo de setembro, sob protestos de entidades representativas dos agricultores franceses, holandeses ou irlandeses. O diplomata aposentado José Alfredo Graça Lima, ex-embaixador na missão brasileira junto à União Europeia, é um dos mais experientes negociadores em tratados comerciais em nome do Brasil e do Mercosul – e estava no posto quando as negociações foram suspensas, em 2004. Ele demonstra pouca esperança de ver os entraves ao acordo serem superados um dia.
“Sempre tem e sempre terá, porque essas controvérsias não vão desaparecer. E aí o acordo fica no limbo”, constata. “Enquanto existir a Política Agrícola Comum (PAC) europeia, não tem expectativas de comércio mais livre para os produtos agrícolas de fora da União Europeia. É uma total impossibilidade.”
O atual momento político na Europa também não é favorável, com a ascensão da extrema direita nacionalista em diversos países. Em plena crise política, tudo que a França não quer é reavivar um tema tão polêmico quanto a associação comercial com o Mercosul.
Além disso, o novo primeiro-ministro francês, o conservador Michel Barnier, seria pessoalmente contrário à conclusão do tratado, segundo o site Euractif apurou com aliados do premiê. Barnier foi o negociador-chefe europeu para o Brexit e é apegado às chamadas cláusulas-espelho, que determinam a reciprocidade entre as duas partes.
Rejeição do acordo pelo PT
O projeto foi lançado há quase 25 anos, passou cerca de 12 anos paralisado e, por fim, só foi concluído durante o segundo ano de governo de Jair Bolsonaro, em 2019. Entretanto, a etapa seguinte, da ratificação pelos Parlamentos dos países membros dos dois blocos, jamais se concretizou, no contexto da disparada do desmatamento na Amazônia. As negociações foram reabertas após a troca de governo no Brasil, em 2022.
Na visão de Motta Veiga, a responsabilidade pelo fracasso até agora é partilhada pelos dois lados. Depois de a União Europeia exigir a inclusão do combate ao desmatamento no texto, o Brasil impôs uma nova lista de condições em contrapartida, como restrições de acesso às compras governamentais nos países do Mercosul.
O especialista lembra que as gestões petistas sempre se opuseram ao avanço das tratativas – e afirma duvidar quando o presidente diz desejar fechar o texto até dezembro.
“Eu não sei se o Brasil espera isso. Eu sou muito cético sobre a...
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Câmbio alto prejudica viagens para o exterior; real não deve se fortalecer tão cedo
9/18/2024
Quem viaja para o exterior a turismo ou faz negócios internacionais começa a se acostumar com o câmbio alto: o dólar e euro em relação ao real subiram no início do ano, dispararam em junho e não baixaram mais. A queda dos juros nos Estados Unidos deve estancar esse movimento, mas não bastará para fazer o real se valorizar.
A moeda americana tem oscilado entre R$ 5,60 e R$ 5,65, ante a cerca de R$ 5 em 2023. Já a europeia é cotada acima de R$ 6,2 – em torno de R$ 0,85 a mais do que no ano passado.
O aumento tem pesado no bolso dos turistas que viajam ao exterior, nota a presidente da Agência Brasileira das Agências de Viagem (Abav), Ana Carolina Medeiros. “A procura não diminuiu, mas a gente percebe que mudaram as escolhas como o tipo de assento no avião, na classe executiva ou na econômica, uma diferença na hotelaria, que fica bem mais restrita para o cliente poder economizar. Ele também muda para outro destino que seja um pouco mais em conta", assinala. "Nós temos buscado, junto aos fornecedores, por mais facilidade de pagamento, como parcelamento no cartão", diz Medeiros.
A expectativa da queda da taxa de juros nos Estados Unidos, que se arrastou ao longo do ano, foi a principal justificativa para a valorização do dólar no primeiro semestre, e em relação não apenas ao real. O peso mexicano chegou a perder 18%.
“Quase sempre, os fatores externos são dominantes, mas a moeda brasileira, como as emergentes de maneira geral, tem se comportado um pouco pior neste mundo com tantas incertezas e riscos, relacionadas à reversão do ciclo monetário que começa no mundo desenvolvido e também pela eleição americana”, salienta Livio Ribeiro, professor e pesquisador do Instituto Brasileiro de Economia (Ibre) da Fundação Getúlio Vargas e sócio da BRCG Consultoria.
Ciclo de queda de juros nos EUA
Nesta quarta, as peças podem começar a se mexer no xadrez do câmbio: o mundo está de olho na reunião do Comitê Federal de Mercado Aberto (Fomc, na sigla em inglês), para uma aguardada decisão sobre o início de um ciclo de redução dos juros pelo Banco Central americano (Fed). O mercado espera um primeiro corte de pelo menos 0,25 ponto percentual nesta quarta-feira – o que já favorece a procura pelas moedas das grandes economias, inclusive o euro.
“No DXY, índice que mede o dólar em relação a outras moedas, principalmente de mercados de desenvolvidos, já podemos ver que o yen está com um peso forte”, nota Thais Batista, gestora de portfolios na Schelcher Prince Gestion, em Paris, onde é especializada em mercados emergentes. “A gente vê que o dólar, no ano, está caindo agora. Já está negativo, provavelmente por causa da força do yen.”
Mas a conjuntura externa não é a única explicação para o real desvalorizado. Aspectos internos no Brasil acentuam a queda: incertezas sobre a situação fiscal do país, ingerências do governo na governança do Banco Central e dúvidas sobre a próxima presidência da instituição são alguns dos fatores que pressionam a moeda nacional.
“O investidor local vive com esse bicho-papão da inflação há décadas e isso influencia muito o câmbio por conta do contexto interno. As questões estruturais do Brasil ainda estão pesando na moeda e nos cenários que os investidores fazem”, observa Batista. “A gente precisaria que eles pintassem um quadro um pouco melhor para o país para justificar uma alta significante do real.”
Impacto no Brasil
Por isso, não se espera uma mudança significativa do câmbio para os próximos meses. A instabilidade no México favorece a maior procura pelo real, entre as economias latino-americanas, e a provável nova alta da taxa básica no Brasil, que também deve ser decidida esta semana, tende a estancar a desvalorização da moeda brasileira.
“A gente tem uma economia que está se mostrando mais forte do que as pessoas imaginavam, com um mercado de trabalho forte e a economia como um todo crescendo bastante, principalmente nos setores de serviços e consumo interno. Tem uma política fiscal expansionista e talvez...
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Bloqueio do X abala ambiente de negócios no Brasil? Especialistas analisam
9/4/2024
Desde o bloqueio da rede X no Brasil pelo ministro do Supremo Tribunal Federal Alexandre de Moraes, empresários alegam que a medida prejudica o clima de negócios no país. A decisão traria um ambiente de “insegurança institucional” para as empresas que operam no Brasil e poderia afugentar investimentos estrangeiros.
Moraes suspendeu as operações e o uso da plataforma em território brasileiro depois que o X se recusou a nomear um representante legal no país, num contexto de suspeita de que a rede estimula a disseminação de conteúdos falsos e discursos de ódio. O dono da rede, o bilionário americano Elon Musk, fomenta há meses um embate com o ministro do STF, que ele acusa de tentar censurar a rede.
O caso gerou repercussão mundial – e ocorre uma semana depois do dono da plataforma Telegram, Pavel Durov, ser detido em Paris por descumprir ordens judiciais.
“O mercado brasileiro pode ser penalizado se alguns atores internacionais estimarem que o acesso está mais difícil. Isso pode criar, a médio e longo prazo, efeitos negativos”, reconhece Julien Maldonato, diretor de digital trust da auditoria Deloitte. “Mas um país deve poder tentar manter uma forma de soberania em alguns assuntos, seja de negócios ou da gestão da comunicação e da informação. É preciso tentar encontrar um equilíbrio dinâmico, porque ao longo do tempo, esses equilíbrios serão sempre questionados.”
Tentativas de controle afetou investimentos na China
Apesar de inúmeras tentativas pelo mundo, o controle das plataformas digitais se tornou quase impossível – nem os países abertamente autoritários conseguem, salienta Nathalie Janson, professora associada de Finanças da Neoma Business School, em Rennes.
“Levanta dúvidas sobre a capacidade das empresas multinacionais poderem fazer negócios nestes países, se as regras podem mudar de um dia para o outro. É uma questão colocada há uns 10 anos na China, aliás, que tem um governo autoritário”, explica a especialista em finanças digitais. “Depois dos problemas com o empresário Jack Ma e diversas proibições de atuação, o clima de negócios se tornou, evidentemente, desfavorável – e a China teve uma baixa dos investimentos estrangeiros. Então, acho que a questão é legítima no Brasil.”
A professora evoca a delicada fronteira da liberdade de expressão, que pode entrar em conflitos com diferentes leis dos países. Janson destaca que em muitos deles, o X salvou vidas e ajudou a combater regimes opressivos.
“A pressão por maior regulação é importante ao gerar debate, para as pessoas saberem por que estão querendo regular as plataformas. Porém, eu não acho que essa pressão terá um impacto maior do que o já vimos na Europa, que conseguiu aprovar o Digital Services Act.”
Para Musk, dois pesos, duas medidas
O caso de Elon Musk tem uma especificidade em relação a outras redes sociais: o bilionário faz uso político da plataforma que comprou em 2022. Ele faz campanha pelo candidato republicano Donald Trump nos Estados Unidos e, de forma mais ampla, milita contra a esquerda.
Musk escolheu a dedo os pedidos judiciais ou de governo que recusaria – em 80% dos casos pelo mundo, acatou sem alarde as solicitações oficiais de suspensão ou fechamento de contas no X, observa Maldonato.
“Estamos vivendo estes novos equilíbrios, nos quais as potências tecnológicas chegam a ter mais poder e impacto que um Estado. Musk pode se servir dessa força tecnológica e capitalista que ele tem para influenciar correntes de pensamento no seu próprio país e no exterior”, afirma o consultor francês. “Ele acha que existe praticamente só um caminho, a corrente de um mercado muito livre e libertário, e que só haverá progresso desta forma.”
A confrontação Musk x Moraes no Brasil impulsionou o crescimento de uma rede social concorrente, o Bluesky, que passou de 6 para 8 milhões de usuários em pouco mais de três dias. Nathalie Janson, entretanto, demonstra ceticismo quanto ao fim da hegemonia do ex-Twitter, anunciada desde que a rede foi comprada pelo...
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Jogos Paralímpicos evidenciam diferenças de acesso a tecnologias por países ricos e pobres
8/28/2024
Os Jogos Paralímpicos trazem à luz os desafios da acessibilidade para as pessoas com deficiência. Por trás do desempenho dos campeões, está uma vasta cadeia especializada em melhorar não apenas a performance dos atletas, mas também o cotidiano das pessoas com deficiência. Mas o evento também ilustra o quanto o acesso dos países às melhores tecnologias é desigual.
Até agora, mais de 1,9 milhão de ingressos já foram vendidos para os Jogos Paraolímpicos de Paris 2024, de um total de 2,5 milhões postos à venda. Com 22 modalidades, a metade da Olimpíada, o evento não desfruta do mesmo prestígio, mas representa um momento único para promover avanços para cadeirantes, cegos e outros.
Um exemplo: apenas 3% da vasta rede de metrô de Paris oferece acessibilidade plena, uma fragilidade que será exposta agora que a cidade espera receber 350 mil visitantes com deficiência durante o megaevento. A realização dos Jogos Paralímpicos força o país a olhar para problemas que costumam ser invisíveis para a maioria dos cidadãos, empresas e tomadores de decisões, aponta Juliette Pinon, pesquisadora do Instituto de Administração de Empresas da Sorbonne, em entrevista à emissora France Culture. Pinon desenvolve uma tese sobre a dimensão inclusiva do legado de Paris 2024.
“Temos um eixo material, sobre coisas que ouvimos falar muito agora, como transportes, infraestruturas e equipamentos esportivos para o evento e para o cotidiano dessas pessoas. E temos o eixo imaterial: a sensibilização para as pessoas com deficiência, a mudança de olhar sobre elas”, afirma a pesquisadora. “É um momento chave para a França, cujas políticas públicas para as pessoas com deficiência foram criticadas por diferentes instâncias, em especial organismos internacionais, pelas violações dos direitos das pessoas nessa situação.”
Diferenças entre delegações
Na Vila Paralímpica, adaptada para receber os 4,4 mil atletas, um centro de revisão e consertos de próteses, cadeiras de rodas e outros equipamentos opera com 164 funcionários do grupo alemão Ottobock, parceiro do Comitê Paralímpico Internacional desde os Jogos de Seul, em 1988.
O local é uma amostra de toda uma cadeia que melhora as condições de vida dessas pessoas. O diretor técnico das instalações, Bertrand Azori, relata que as visitas ao centro evidenciam o fosso que existe entre as delegações de países ricos e pobres, onde o acesso a tecnologias mais avançadas é baixo.
“Já teve prótese feita com cano de encanamento, de plástico, cumprindo o papel do alongamento da prótese. E a gente sempre tem que encontrar uma solução”, comenta, à RFI. “Tem próteses improvisadas, outras que vemos que foram consertadas em casa. Há próteses de joelhos que não víamos há mais de 30 anos, e neste caso somos obrigados a trocar porque aqui temos tudo que precisamos para consertar, mas tem uns modelos que nem saberíamos como fazer para consertar.”
O centro dispõe de cerca de 60 cadeiras de rodas para empréstimo, tem 15 mil peças no estoque e impressoras 3D que podem fabricar novas. O arqueiro francês Damien Letulle passou para verificar as rodas da sua cadeira, a poucos dias do início das competições paralímpicas.
“Eles são muito competentes e vemos como eles prestam atenção em cada detalhe. A gente já tem que estar muito concentrado e não devemos estar preocupados com um probleminha técnico que nos atrapalharia”, diz o atleta. “Eles fazem de tudo para que a gente possa estar com a cabeça fria para praticar a nossa modalidade da melhor forma.”
Tecnologia da Airbus a serviço dos atletas
No ambiente da alta performance das Paralimpíadas, a tecnologia pode fazer toda a diferença – e pode vir de pesos-pesados do setor, independentemente da área de atuação principal. A quase 700 quilômetros ao sul de Paris, o laboratório de inovações da fabricante de aviões Airbus desenvolveu 30 equipamentos paralímpicos em parceria com a Agência Nacional do Esporte francês, como bicicletas melhor adaptadas ou um punho que torna a prática de esgrima mais...
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